Com o seu vestido novo e seu indefectível blush e batom vermelho, ela se vê no espelho enquanto some em seus nauseantes devaneios. Os homens nem ao menos se barbeiam mais ao passo que as mulheres estão cada vez mais lindas. Ela pensa em todos os cifrões da indústria da beleza ali em sua penteadeira. Sua pele é tão macia, seu perfume, tão sofisticado, seu corte de cabelo a deixa leve. Ela é "verdadeiramente" sexy. Para isso se abdica de muitos minutos que poderiam serem gastos de maneira diferente. Mulheres nunca são legitimamente livres. As demasiadamente independentes ou se enrigeceram muito ou intimidam por demais os homens- que preferem as mais comuns, menos inteligentes e consequentemente menos desejadas.
O interfone toca e ela sai. Desanimada entra no taxi dizendo boa noite e o itinerário até o scoth bar. Bares não são os lugares mais adequados para se ir sozinha, mas ela não tem muitas opções. O taxista se esforça para começar algum assunto, mas ela está absorta olhando pela janela. Seu reflexo nas luzes da noite viva. Ela não o dá gorjeta- o faria se ele tivesse sido discreto. E entra pela porta. As outras mulheres usam roupas muito curtas ou muito casuais. Os homens usam as camisas desleixadas e desabotoadas. Todos falam alto por demais. Ela se senta sozinha, na mesa mais afastada. Intimamente deseja ficar assim por toda a noite... observando os quadros, aquelas pessoas toscas, e ouvindo a música abafada pelas muitas vozes disconexas. É como estar em outra realidade.
Mas o olhar de "Não se atreva!" é menos forte do que o falso apelo de uma mulher sentada sozinha e em menos de dez minutos ela é assediada pela maioria dos homens ali. As outras mulheres ficam mais caladas e lançam olhares gelados enquanto um meninote se aproxima e senta, só depois pergunta se pode ficar ali. Ele tenta impressioná-la pedindo uma bebida medianamente cara e lhe dizendo que é dono de seu próprio negócio. Como a presença dele tira parte de seu prazer, ela opta por pedir um drink simples mesmo podendo pedir algo que estivesse fora do cardápio. Profissionais liberais são o mesmo que desempregados desiludidos, mendigando centavo por centavo por uma estabilidade inexistente. Provavelmente aquela seria a última bebida que o rapaz viria a se servir aquela noite. Com o tempo encurtado pelo orçamento, ele a pergunta, ela o responde prontamente:"-Não sou livre!" e ri, ele obviamente não percebe a ironia.
Ela se sente deslocada de maneira proposital. É bom se sentir fora de casa. Mesmo que a realidade íntima não esteja ali, naquele lugar ou em qualquer outro. Muitas coisas que não existem mais, ou nunca existirão. É senão desprezível aceitar menos do que se tem à oferecer. Ela não é hipócrita consigo mesma...mesmo que isso lhe custe possuir uma solidão.
Acende um cigarro e pede um drink. Ignora tudo- menos suas fantasias. Aquele garçon deveria vestir-se de terno e esvaziar sempre que possível o cinzeiro. As pessoas o tempo todo lhe convidando para sentar à suas mesas e beber cerveja em copos americanos. Elas e eles a devoram como esfomeados. O cheiro azedo da cevada a faz lembrar de suor, dias horripilantementes quentes e homens sujos depois de um dia inteiro no trabalho com seus sonhos drenados por prazeres que eles nem ao menos podem comprar todo dia. Ou beber ou comer.
Se abstrai por um instante, pousam delicadamente uma garrafa do melhor vinho da casa e enquanto lhe servem uma taça-bonita, gorda e erótica- o garçon lhe diria em tom solene que o vinho era cortezia do cavalheiro de preto à sua esquerda. Lañça um olhar discreto, sorri e se enrubesce. Ele faz que não olhava. Então ela prova do vinho levando devagar a taça até seus lábios. Úmido, encorpado, rubro, dançando em sua língua e logo se evaporando voluptuosamente...é preciso trancar um pequeno gemido, suas coxas suadas se apertando por debaixo da mesa- uma contra a outra. O vinho frio e o vapor quente de seu hálito pinta de névoa a borda da taça.
Ele lhe sorri pretensiosamente e ela em um gesto simbólico ergue a taça em um brinde imaginário. O cavalheiro pede para se sentar junto dela mesmo sabendo que o gesto anterior sinalizava um convite. E eles conversam a noite toda, ela não bebe mais do que duas taças acompanhadas de outra com água gaseificada. O homem pede a conta daquela mesa, e ao sairem se oferecere para levá-la até em casa. Naturalmente ela deve recusar a gentileza e se limitar a entregá-lo um com o seu número. Ele chama o taxi, abre a porta e os dois se despedem com um aceno.
Na semana seguinte ela receberia um buquê grande de rosas vermelhas com um convite para jantar em um restaurante refinado, com mesas reservadas e vista para a enceada. Seu cavalheiro seria cortez o bastante para saber que um jantar em sua casa seria avançar demais. Eles teriam uma noite agradabilícima. E ela, se aproximaria do rosto dele e lhe daria um beijo lânguido contra as bochechas a nível de promessa.
"-Isso sim é sexo!"- irrompe de sua boca, ecoa pelo scoth bar assombrando a todos. Não se incomoda por haver estado fantasiando. Pede a conta e sai com inteiro desprezo por aquelas pessoas.
Caí no seu blog por acaso e li dois textos. Gostei da forma que vc escreve. Gostaria de fazer contato,se quiser me escrever vou deixar neu e-mail: lyyudi@yahoo.com.br
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