Primeiro escuta-se o barulho dos passos. A consciência um pouco enebriada pelos sonhos, ainda sem saber se era verdade. Então a voz. "Acorde, minha gatinha, estou em casa". Ela abria os olhos de plumas e ele sorria ao ver que tinha um pouco de remela neles. E então ela virava de novo. "Ei, você tem que acordar, garotinha, eu preciso de você". Então um "bom dia" rouco e afável. Ele a beijava sofrêgamente e contava várias histórias sobre o futuro. Ele a envolvia em uma corrente mítica e antiga e a fazia entender o significado de palavras novas em um dialeto estranho. Ele dizia que o amor dela era como "Deus"... inexplicável em palavras humanas. E então, ela se levantava, se lavava do cheiro dos dois e ia trabalhar.
Eles se conheceram casualmente, ele disse que estava apaixonado casualmente,(mas ela já estava apaixonada) e assim foram criando rituais e rituais. A teia da ficção urdindo urdindo urdindo como uma louca a teia de uma vida conjunta...e aos poucos ela ia jogando fora tudo, até seu próprio nome, e vestindo aqueles sonhos... tão perto do adormecer essa realidade. E ia sorrindo pelos cantos, e se gabando dessas horas. Íntimas, íntimas, pensava.
Mas um dia os passos não vieram, e ela não sabia se ele estava vivo ou não. As amigas diziam para ela esquecer, mas ela dizia que ele ainda não a tinha matado, então que gostaria que ele continuasse pensando nela com carinho. (Mas dentro, ele a assassinava com a ausência, e quando o relógio batia cinco da manhã ela estava agônica e então morria)... "mas ele não significa nada, minha querida"... "eu juro".
"Acorde. É de verdade", e ele voltou. Ela ainda o esperava por dentro. E quando ele se foi de novo, ela passou a trancar a casa. Anos passaram e ela trancou também seu corpo. Se casou, teve filhos, mas carregava pra sempre esse fantasma vivo, o não saber, o fantasma das cinco da manhã, aquela necessidade urgente que se tornou medo...um dia...passos... "acorde, minha gatinha"...
UAU!!! Você está cada dia melhor!
ResponderExcluirVenho acompanhando seus contos e cada vez me surpreendo.
Amo seu jeito "sexy de ser"....
Qualquer dia desses vou te mandar um conto meu (hahahaha)
Abraços,
Vanessa
sabe, eu acho que o passado são nossas paredes,
ResponderExcluiro negócio é fugir de casa,
e deixar tudo pra tráz mesmo.,
e que venham as verdades,
pois quem dá conselhos nem sempre
consegue seguí-los, não é mesmo?
adorei a história,
ela diz muito sobre você,
ou estou enganado?
acho que consegui pescar o sentido todo...
bjs
do Felipe Godoy
adoro seus textos..;
Mari realmente você está me surprendendo a cada novo texto.
ResponderExcluirMuito bom, tem algo sufocante nele que me agrada.
Ass:Rafael Franco
Todos eles têm Felipe... são distorções da minha realidade- passado, presente e futuro tudo misturado!Te adoro, Big Fish! Beijo!
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