O ser humano é um animal triste. A sensibilidade torna as coisas pequenas em memoráveis. Tudo que é belo é um pouco melancólico. Se fôssemos simples gatos, preocuparíamos apenas em nos limpar com a língua áspera e pequenininha, ignorando o universo dos outros milhares de gatos. Os gatos são os animais mais livres que já conheci.
Entendo quando comparam, por exemplo, um facínora com uma besta selvagem. Tal como a besta, o criminoso é alheio à sua humanidade e por não vivê-la, não se identifica com uma lágrima ou com uma gargalhada.
Mas nada explica o suicida. Nem mesmo a Sophia Coppola e suas virgens castradas. Por isso o suicídio é tão terrível. Não há morte mais triste. Talvez porque com cada suicida, várias pessoas-inclusive eu-pensem também em se suicidar um pouquinho e temem que o mundo termine em um caos de pés que se balançam longe do chão. O ultimato da escolha. A única escolha que se faz sozinho... que como uma mariposa imponente rasga seu casulo e esvoaça em nossas mentes de tempos em tempos.
Opção desconsiderada. Portanto, nem se deve ser chamada opção. É mais uma coisa.
Coisa com a qual me deitei algumas vezes. Afundei a cabeça no travesseiro e suspirei ignorando-a. Deixar de existir. De ter dores, minhas dores inventadas e tão particulares. Viver cansa. É como se cada vez que o ar entrasse pelas narinas, ele fosse sôfrego e pesado, mas basta prender o ar por dois segundos para se desistir. Se eu pudesse simplesmente sumir já o teria feito a cada ruflar dessas asas.
Penso se não é algo que tenho em comum com todos os seres humanos, que por natureza são tristes. Penso o que nos mantêm afastados do suicídio. Penso nos meus cigarros e no câncer de pulmão. Escolhas. Ontem li: "sem meus cigarros eu morro" e a frase me pareceu absurdamente verdadeira. Morro com eles e sem eles.
A vida é um beco sem saída onde no fim se entrega o óbolo ao barqueiro sombrio querendo ou não. Todos teremos afinal, as moedas por sobre as pálpebras rijas. Isso é natural.
O que nos faz tragar cada pedaço dessa vida? Medo da cinza chegar até o filtro? Amor? Masoquismo? O outro? A "natureza"? Muitos diriam que o medo do que virá depois do último trago. O ser humano é metódico e sistemático. Todos sem exclusão temem o desconhecido com o medo mais infantil e enorme de que se é possível lembrar.
A imaginação é minha borboleta. Disse alguém de dentro de um escafandro. O escafrando é uma prisão em que se é permitido apenas piscar.
Nesse momento, tão grave, devemos abrir todos os casulos(de outro arthropoda).
Podemos então, pegar uma corda em volta de um pescoço e transformar em um rabo longo. Dedos tensionados em garras retráteis dentro de uma patinha fofinha. E o som da última tentativa de inspirar e transformar em um miado louco e selvagem. Um miado de alguém que de agora em diante se ocupará penas de caçar borboletas, espreguiçar de maneira elástica e ser o mais livre dos humanos.
(Para uma menina quase desconhecida e muito impetuosa)