domingo, 14 de junho de 2009

Prefácio de um livro fictício.

“Todo o estado de alma é uma passagem. Isto é, todo o estado de alma é não só representável por uma paisagem, mas verdadeiramente uma paisagem. Há em nós um espaço interior onde a matéria da nossa vida física se agita. Assim uma tristeza é um lago morto dentro de nós, uma alegria um dia de sol no nosso espírito...”

Fernando Pessoa em Cancioneiro

“A poem should not mean
But be”

Archibald MacLeish em Ars Poetica

O papel que é feito de carne. A minha carne. Escrevo para um leitor que desconheço e ainda assim, com quem entrelaço os dedos e me deixo guiar para dentro do que sou como palavras. Não entendo o sentido do que eu faço, não sou mais do que uma criança abandonada a quem estranhos esticam um pouco de afeto em forma de uma mão que poderá acariciá-la ou matá-la. A diferença é que não será eu quem chegará a algum destino, sou simplesmente quem lança essa criança à sua própria sorte. Não presenciarei o final do processo, embalde tenha gestado e parido.
Mas há nisso tudo uma necessidade primeira. Essa necessidade estranha do ritual da escrita. Corro à escrever como corro à viver- com uma ânsia agônica. Minha escrita é uma vida sem controle onde se é recém-nascido o tempo todo. Sou livre dentro dela, exatamente por senti-la como algo que não me pertence. E paradoxalmente se trata(a minha e possivelmente qualquer escrita) dos fragmentos desfigurados de percepções sobre a realidade ou irrealidade do que sou. Se há um amadurecimento, se há arte no que faço, não posso perceber. As coisas simplesmente o são. Dessa maneira me encontro com um eu que escreve, o sendo. Um apêndice da minha existência...
... ou talvez a parte imersa do iceberg que todos somos.


ps.: Aos meus leitores, meu pesar por não conseguir revisar meus textos... não consigo me reencontrar com eles ainda, e as inconcordâncias verbais e demais desmazelos tomariam o lugar que deveria ser de um tempo real, e meu blog deixaria de ser essa coisa (ir)real e de tempo inteiramente emocional... espero que minha dislexia desleixada(é com x ou com s?) não atrapalhe(muito) a leitura.

terça-feira, 2 de junho de 2009

Relato: Fumaça

Birrea de Sclerocarrya


Quando seguro o meu destino entre o indicador e dedo médio me sinto dona de mim. Como tudo nessa minha vida tenho que significar, não há o que eu faça só pelo prazer carnal. O prazer pra mim corre em outras veias e pulsa em outros lugares. Meu prazer é relacionado intrinsicamente ao que eu significo. Nem sempre para os outros. A minha melancolia vem em não ser escritora da minha vida real.




Duas vidas, uma lida outra subtendida... e as pessoas não são boas em ler nas entrelinhas das ações reais. Isso faz com que eu seja uma escritora frustrada de minha própria história e assim corro para os braços do meu leitor desconhecido, ou conhecido às vezes, esperando que eu assim, tenha mais voz. Embalde continue muda.




Ele é pequeno e fálico. Sempre os de sabor exótico e sofisticado(entende-se que custa caro), afinal, não é um prazer que eu declare banalizado. São poucos por semanas...e atualmente tem sido nenhum. É como o damasco ou marula. Nunca falei disso antes... mas está longe de ser um vício vulgar. Pessoas vulgares têm vícios vulgares.




O que se subtende derretê-lo, matando-o lentamente(e me matando lentamente), a pequena brasa acesa, a fumaça dançante é que sou poderoza. Imagino que a cinza que caí são pedaços que se decompôe do símbolo fálico, do domínio do homem sobre as mulheres...e assim, devoro com a minha respiração, devoro com a minha simbologia, o instrumento de poder e da subjulgação idiota, idiota, idiota a qual nos temos submetido por séculos e séculos.




Com o cheiro da fumaça em minha narina, a boca e o pulmão cheio dela, grito. Ela é o meu grito de emancipação. É o meu grito de sou dona das minhas escolhas, da minha própria vida, da minha merda de vida e também do meu dinheiro. Também dona da minha morte.




Com o meu destino entre os dedos indicador e médio, brinco de ser mulher de verdade, crescida e livre, brinco de não querer ser beijada por ninguém, além do languido beijo de língua erótico do tabaco e de um café depois talvez.




E assisto a bucólica névoa levar para longe longe longe meu corpo, que é só matéria estúpida... como todo o corpo o é. Como todo sentido é estúpido. Como são cegos os sentidos das minhas ações... quem olha vê um sorriso de liberdade e o confunde com um sorriso de vício.




"Nada personifica o Espírito da África - a essência do AMARULA - tanto quanto o elefante africano. Símbolo duradouro, este gigante majestoso da savana africana evoca imagens eternas de uma vida selvagem não-influenciada pela modernização e industrialização."